
As exigências da Casa Branca por um aumento drástico nas prisões de pessoas que entraram de maneira irregular no país aumentou a pressão sobre os oficiais de imigração para cumprir a promessa do presidente americano Donald Trump de promover deportações em massa.
O Serviço de Imigração e Controle de Alfândega (ICE) está realizando batidas em locais de trabalho em todo o país, como a ocorrida no distrito de Los Angeles na semana passada, que desencadeou os protestos e uma ampla resposta federal. A agência está escalonando turnos para ter agentes disponíveis sete dias por semana e atender às metas de prisão, além de convocar investigadores criminais — que normalmente se concentram em crimes como tráfico humano — para ajudar a identificar alvos. Também está pedindo ao público que denuncie imigrantes irregulares por telefone.
O trabalho do ICE é impulsionado por um novo aplicativo de mapeamento que localiza pessoas com ordens de deportação que podem ser rapidamente removidas, a partir de dados reunidos por diversas agências do governo, segundo documentos obtidos pelo The New York Times.
— Eu disse desde o primeiro dia: se você está no país ilegalmente, não está fora da mira — disse Thomas Homan, o czar da fronteira de Trump. — Estamos ampliando esse escopo.
Stephen Miller, vice-chefe de gabinete da Casa Branca, está profundamente envolvido no esforço, mantendo reuniões com altos funcionários do ICE e analisando os números de perto, segundo fontes com conhecimento do assunto.
A intensa pressão de autoridades do alto escalão do governo cria um ambiente propenso a erros, justamente quando agentes estão sendo forçados a tomar decisões de grande impacto, disseram ex-funcionários.
— Você vai ter pessoas levadas ao limite, que na pressa podem cometer erros, inclusive sobre o status imigratório de alguém — afirmou Sarah Saldaña, diretora do ICE durante o governo Obama. — Tudo isso exige tempo e cuidado, e essa pressão por números sem levar em conta se o trabalho está sendo bem feito é muito preocupante.
Autoridades da Casa Branca afirmam que as medidas são necessárias.
— Cumprir a promessa do presidente Trump de deportar imigrantes ilegais é algo que o governo leva a sério — declarou a porta-voz Abigail Jackson. — Os distúrbios violentos em Los Angeles, incluindo ataques contra agentes federais que apenas executavam operações básicas de deportação, mostram por que a remoção de ilegais é tão importante.
As apostas políticas são altas: Trump foi reeleito com base na promessa de combater a imigração irregular e implementar deportações em massa logo no início do mandato.
Desde o retorno de Trump ao poder, mais de 200 mil pessoas que estavam nos EUA sem autorização foram enviadas de volta ao seu país de origem ou a terceiros países — uma fração dos 1,4 milhão com ordens finais de deportação em vigor até o fim do ano passado, segundo dados internos obtidos pelo New York Times.
Miller, defensor ferrenho do endurecimento nas fronteiras dos EUA, afirmou à Fox News, no fim de maio, que o ICE teria uma meta mínima de 3 mil prisões por dia — número sem precedentes e dez vezes maior que a média diária durante o governo do seu antecessor, Joe Biden. Desde 21 de janeiro, mais de 100 mil pessoas suspeitas de estarem irregularmente nos EUA foram presas, segundo dados obtidos pelo jornal americano.
Em uma reunião com líderes do ICE no fim do mês passado, Miller revisou a taxa de prisões da agência e discutiu formas de aumentá-la. Segundo fontes, ele sugeriu que agentes mirassem membros de gangues aparentes, identificáveis por tatuagens visíveis.
— Ele não impôs uma cota específica, mas passou os números e reforçou que devemos usar todos os nossos recursos para realizar prisões — disse Garrett Ripa, chefe do ICE em Miami, então responsável pelas operações de deportação da agência.
Ripa afirmou que o ICE pediu mais recursos ao vice-chefe de gabinete, como ajuda extra com transporte, para atingir as metas ambiciosas. Outro funcionário presente na reunião, que falou sob condição de anonimato, disse que Miller chegou a perguntar se a agência conseguiria realizar um milhão de deportações neste ano.
Atuais e ex-funcionários relatam que a pressão elevada tem minado a moral interna e criado um clima de tensão.
— Há um estado constante de ansiedade — disse Jason Houser, ex-chefe de gabinete do ICE sob o governo Biden. — Eles sabem que estão jogando o jogo de Stephen Miller. Isso não tem a ver com segurança pública, e sim com cumprir metas numéricas. Só isso.
Alguns agentes do ICE, no entanto, aprovam o foco intenso.
— É algo em que estou investido, então não vejo como algo ruim — disse Carlos Nuñez, supervisor de deportações na Flórida. — Temos tanto trabalho que, sinceramente, não há horas suficientes no dia para dar conta. Minha equipe está trabalhando sete dias por semana, sem descanso. Eu mesmo não tiro um dia de folga há meses.
Ripa confirmou que muitos agentes trabalham em turnos escalonados para cobrir toda a semana. Segundo o Departamento de Segurança Interna, esse sistema de turnos não é novidade.
O New York Times acompanhou Nuñez e outros agentes do ICE em Miami durante uma série de prisões. Em algumas horas, mais de dez agentes, incluindo membros do FBI e do Departamento de Estado, prenderam três imigrantes.
Em um dos casos, um hondurenho foi detido por estar no local no momento em que levava o irmão, o verdadeiro alvo da operação, ao trabalho — um exemplo de prisão colateral usada para aumentar os números. Esse é o mandato atual, disse Homan.
— Se encontrarmos um alvo e ele estiver com outras pessoas ilegalmente no país, todas serão detidas — afirmou. — Não vamos ignorar um imigrante ilegal.
As prisões em Miami revelam um dos maiores desafios para o ICE: o trabalho é minucioso e, muitas vezes, de baixo rendimento. Os agentes passam horas em vigilância, e endereços costumam estar desatualizados.
Nas últimas semanas, o ICE passou a realizar batidas em locais como bares, restaurantes e fábricas, visando prisões em massa. Também começou a prender migrantes em tribunais de imigração, com apoio de promotores, durante audiências marcadas.
A agência tem incentivado o uso da linha direta para denúncias. Em maio, cinco homens foram presos em um estacionamento em Baltimore após uma denúncia telefônica. O vídeo da prisão foi postado nas redes sociais com a legenda: “Quando você liga para nossa linha de denúncia, nós ouvimos!”
Segundo Homan, essas prisões são válidas caso haja “suspeita razoável” de que a pessoa está irregularmente no país.
Em alguns escritórios, investigadores que costumam atuar em casos como tráfico humano foram designados para impulsionar as prisões. Um oficial do DHS, sob anonimato, contou que agentes infiltrados que investigam tráfico sexual têm marcado encontros com suspeitas de prostituição para detê-las por infrações imigratórias.
A tecnologia também entrou em cena. Um novo aplicativo de mapeamento permite que agentes visualizem áreas com grandes concentrações de pessoas com ordens de deportação, segundo Ripa e documentos obtidos pelo New York Times. Uma versão inicial do app foi chamada de “Alien Tracker” (ou Atrac).
O projeto contou com apoio do Departamento de Eficiência Governamental, liderado pelo bilionário Elon Musk até o mês passado. A Casa Branca se recusou a comentar.
— Nas fases iniciais do Atrac, eles foram parte essencial — disse Ripa.
O app, acessível por celular, mostra onde estão os migrantes com ordens de deportação e permite filtrar por antecedentes criminais.
— O mapa de calor indica onde há ordens finais de remoção executáveis. O agente pode dar zoom na área — explicou Ripa.
O banco de dados reúne informações de mais de 700 mil pessoas, incluindo dados do FBI, ATF, Serviço de Delegados Federais (Marshals) e da Previdência Social. No futuro, o sistema deve centralizar dados do Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano, Departamento do Trabalho, Saúde e Receita Federal.
A consolidação desses dados gerou polêmica. Funcionários de carreira contestaram o acesso aos bancos de dados, citando violações de privacidade. Sindicatos e grupos de fiscalização entraram com ações judiciais para barrar a medida.
As informações no app aparecem em formato de “ficha de beisebol” e os agentes precisam registrar o resultado de cada abordagem. Apesar da sofisticação, alguns agentes relatam que os endereços exibidos são imprecisos ou desatualizados.
A agência também enfrenta entraves em cidades como Los Angeles, onde uma decisão judicial de 2024 proíbe abordagens domiciliares com intenção de prisão. Segundo especialistas, esse tipo de prisão representou mais de 25% das detenções residenciais do ICE.
No fim de maio, Bill Essayli, procurador interino da Califórnia Central, ordenou que agentes do Departamento de Justiça assumissem as abordagens nas residências. Um porta-voz confirmou a iniciativa.
Há sinais de que o esforço do ICE está surtindo efeito. Segundo o DHS, 2 mil pessoas foram presas por dia na última semana. A Casa Branca usou os dados como evidência do sucesso da ofensiva.
Mas os números caíram nos dias seguintes: na quinta-feira, 1.400 prisões; na sexta, pouco mais de 1.200; no sábado, cerca de 700.
Mesmo diante dos protestos em Los Angeles, Homan segue firme.
— Vamos continuar essa operação de imigração — disse ele no programa da ativista de extrema direita Laura Loomer. — Faremos isso todos os dias, inclusive em L.A. Ninguém vai nos parar. Então, podem considerar que o jogo começou.
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