
O direito à cidadania italiana originário e sem limite de geração foi reafirmado pela Corte Constitucional da Itália por meio de uma sentença publicada na última quinta-feira, 31 de julho. Mas atenção: a decisão não muda em nada as novas limitações impostas aos brasileiros descendentes de italiano em março.
A decisão da Corte presente na Sentença nº 142/2025 não diz respeito ao Decreto-Lei 36/2025 (já convertido na Lei nº 74/2025), que desde março limita o direito à cidadania italiana para descentes estrangeiros. Na verdade, o julgamento foi sobre os questionamentos de quatro Tribunais Ordinários, de Bolonha, Roma, Milão e Florença, feito em novembro de 2024, sobre a constitucionalidade do formato do reconhecimento da cidadania italiana sem limite de gerações e sem obrigação de haver ligações com a Itália, explicou jurista italiano David Manzini, CEO e fundador da Nostrali Cidadania Italiana.
“A Corte foi chamada a julgar se as dúvidas levantadas pelos tribunais eram admissíveis e as declarou inadmissíveis (…) Em termos mais simples, fica tudo como está: os processos anteriores a entrada em vigor do Decreto 36/2025, em 28 de março, seguirão sendo julgados segundo a Lei de 1992, que garante o direito à cidadania originário, e não adquirido, que se estabelece a partir da filiação. Mas a nova legislação continua em vigor e é válida em todos os processos a partir de 28 de março, apesar de apresentar diversos perfis de inconstitucionalidade”, explica Manzini.
O que o descendente brasileiro deve fazer?
“Esperar sempre foi um tiro no pé” para Manzini. O jurista que aconselha quem tem interesse em obter a cidadania italiana deve fazê-lo o quanto antes, porque, ainda que a lei originada pelo Decreto 36/2025 eventualmente caia, por ser considerada inconstitucional, o cerco está se fechando.
Isso porque, com o temor de que o Decreto 36/2025 caia, o parlamento italiano já está agindo. Um exemplo é o projeto de lei subsequente, o AC 2369, que ainda está em tramitação, e tenta tornar o reconhecimento da cidadania um processo mais lento. Ele prevê a centralização das solicitações num novo órgão dentro do Ministério das Relações Exteriores com sede em Roma, um teto anual de pedidos e prazo de conclusão de até quatro anos – hoje são dois anos.
“A tendência é que esse processo sempre se torne mais complexo, mais lento e até mais caro – levando em conta o aumento das taxas e o câmbio. Então mesmo agora, num cenário péssimo, eu não esperaria. É o que resta: entrar com um pedido de reconhecimento de constitucionalidade da cidadania, pela via judicial”, finaliza.
Para a advogada Gabriela Rotunno, CEO da Rotunno Cidadania, “é hora de agir – com estratégia”. Ela explica que quem nunca entrou com o pedido (nem administrativo nem judicial) e nem apresentou qualquer documentação até 27 de março de 2025 tem duas opções realistas e seguras hoje:
• Aguardar a decisão final da Corte Constitucional sobre a validade do novo decreto, e nesse caso recomendamos já organizar documentos e buscar orientação para estar pronto no momento certo;
• Ingressar imediatamente com ação judicial, especialmente nos casos com bons fundamentos, já que os processos levam cerca de dois anos para serem julgados.
“Quem entra agora já estará protegido e com o tempo a favor”, pontua Rotunno.
A inconstitucionalidade do Decreto-Lei 36/2025 e a expectativa pela análise da Corte
Haverá um julgamento do mérito da constitucionalidade do Decreto-Lei nº 36/2025, devido às recorrentes denúncias sobre potenciais inconstitucionalidades, mas não há uma data para tal.
“Como o tema é sensível, complexo e afeta milhões de pessoas em todo o mundo, espera-se que o julgamento ocorra entre o final de 2025 e o primeiro semestre de 2026, mas a Corte ainda não publicou oficialmente o calendário”, explica Rotunno.
Fato é que os especialistas consultados pelo InfoMoney estão otimistas sobre o tema.
“A decisão da Corte no julgamento dessa semana foi melhor do que esperávamos. Na sentença da última quinta-feira a Corte estebeleceu que, no entendimento do direito, o vínculo de cidadania é baseado no vínculo de filiação, não prescreve e pode ser reconhecido a qualquer momento, desde que comprovado. Além disso, a Corte relembrou que só quem pode estabelecer normas sobre o tema é o legislador, ou seja, o parlamento, mas desde que respeitem os parâmetros e razoabilidade e proporcionalidade da Constituição”, explica Rafael Gianesini, sócio-fundador e CEO da Cidadania4u, que entende que o entendimento da Corte é congruente com os argumentos contra a constitucionalidade do Decreto-Lei 36/2025.
O primeiro argumento diz respeito sobre o uso errado do decreto no caso desta determinação. “Decretos só podem ser usados em situações de extraordinária necessidade e urgência. Se a corte entender que ele foi usado para agilizar uma decisão que cabia ao Parlamento, ele cairá”, explicou Manzini.
“O entendimento é que a cidadania não é transmitida no reconhecimento, e sim no nascimento. Você nasce italiano, segundo a legislação do país, desde 1865”, explica Gianesini.
O segundo – e talvez mais robusto – argumento diz respeito à retroatividade dos efeitos do decreto, que passou a valer para todos os descendentes italianos, de todas as gerações, inclusive aqueles que nasceram antes da nova legislação.
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