
Criado em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense, e na Penha, na Zona Norte do Rio, o carioca Matheus Duarte, de 31 anos, sempre teve espírito empreendedor. Em 2017, largou o emprego de designer gráfico no Procon para se aventurar num negócio próprio. Começou vendendo brigadeiro em uma bicicleta adaptada: não deu certo. Acrescentou o brownie na cartela de produtos, e foi para as feiras de comida. Também não funcionou. Passou, então, a oferecer bolos de pote em lojas de Ipanema, na Zona Sul. Aí a coisa começou a andar. Hoje, com a prima Jéssica Veras, de 29, e a amiga Thayanini Magalhães, de 31, comanda a Afagá, no Andaraí, badalada confeitaria que faturou R$ 1,2 milhão no ano passado.
Histórias como esta não são tão comuns, mas se repetem quando há perseverança, foco, fé no que se faz e boa dose de criatividade. Foi dessa forma que Adenilson Félix de Lima Santos, de 49 — que aos 15 começou como empregado numa carrocinha de pipoca na Praça Tiradentes, no Centro —, fez do produto que se tornou seu ganha-pão um patrimônio carioca e saiu das ruas para as lojas. São quatro estabelecimentos fixos, sendo que o primeiro em shopping deve ser aberto nos próximos dias. E já há até franquia da Pipocas Maná.
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Andrea Palmeira, de 50, moradora em Nova Iguaçu, ainda não é propriamente uma empresária bem-sucedida, mas está no caminho. Há cerca de dois anos, no auge de uma crise de depressão, começou a comprar plantas compulsivamente. Curiosamente, viu nessa mania uma forma de ganhar dinheiro. Com uma amiga, montou uma banquinha no estacionamento de um Ciep no bairro Rosa dos Ventos, para vender mudas e arranjos de flores nos fins de semana e em datas especiais, como Dia das Mães. A sócia desistiu logo, mas ela seguiu adiante e, há um ano, alugou um pequeno espaço no bairro, onde também mora, e montou floricultura e loja de presentes.
Sucesso entre famosos
Os três casos são exemplos de determinação, mas também de muito perrengue. Levantamento recente do Sebrae mostra que microempreendedores individuais têm a maior taxa de fracasso entre os pequenos negócios: em média, 29% desses comércios fecham as portas após cinco anos. E são muitos tentando um lugar ao sol. Somente nos três primeiros meses deste ano foram concedidos 68,9 mil novos registros de microempreendedor individual (MEI) em todo o Estado do Rio.
— Já fui expulso de lojas por estar vendendo. Já vi gente gritar comigo e pessoas com medo, achando que eu fosse assaltá-las. Mas a maior dificuldade é achar que sua vida inteira vai ser aquilo ali — diz Matheus, ao se recordar dos tempos em que vendia bolo de pote em Ipanema.
No começo, o trio da Afagá optou por dois caminhos: enquanto Thayanini percorria as salas da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), em Manguinhos, oferecendo bolos de pote — caminho aberto pelos pais de Matheus, que trabalhavam no local e consideravam o espaço certeiro para as vendas, já que os funcionários não têm muita opção —, o rapaz partiu para Ipanema. O ambiente era considerado hostil e incerto, mas tinha uma vantagem: mirava consumidores com potencial financeiro maior — Jéssica é confeiteira e, até hoje, é quem cuida da produção.
A sorte do trio começou a mudar na pandemia. Foi quando muitos negócios estavam naufragando que a Afagá — nome vem de afago e já existia desde os tempos de rua — começou a crescer. Eles passaram a fornecer também bolos e doces para festas e empresas. Quando a pessoa que cuidava da contabilidade informou que eles não se enquadravam mais como MEI, pois o faturamento anual já tinha ultrapassado o teto de R$ 80 mil, na época, é que se deram conta de que o negócio estava dando certo.
Foi aí que, em 2021, alugaram um casarão na Rua Uruguai, na Tijuca. Nas redes sociais, o empreendimento atraiu a atenção de famosos como Camila Pitanga, Renata Sorrah e Paulo Betti, que ajudaram a ampliar o alcance da nova confeitaria, que hoje tem filas para experimentar doces como o bolo de caramelo salgado, sucesso desde a época das ruas, cuja fatia custa R$ 26. Em breve, a Afagá, que tem uma equipe de 18 pessoas, vai abrir sua primeira filial, uma loja no Shopping Tijuca, e já mira a Zona Sul.
— A trajetória da Afagá comprova que não é só a Zona Sul e a Barra que oferecem oportunidades no setor — diz Fernando Blower, presidente do SindRio.
A história da Pipocas Maná é cheia de percalços. Adenilson, mais conhecido como Denilson, perdeu duas barracas, que pegaram fogo no ano passado, e teve uma delas — na Cinelândia — levada por fiscais da prefeitura. A apreensão gerou comoção não só nos clientes como nos vereadores da vizinha Câmara Municipal que, sensibilizados, aprovaram uma lei, em 2023, declarando a Pipocas Maná (com seus mais de 20 sabores) patrimônio cultural carioca de natureza imaterial. Depois disso, o negócio cresceu, indo para as lojas, mesmo sem nunca ter saído das ruas.
A primeira loja foi aberta no ano passado, na Rua Senador Dantas. Mas também é possível experimentar a Pipocas Maná — nome retirado da Bíblia — em outras lojas no Recreio e em Duque de Caxias. A próxima será no Shopping Madureira. A Rocinha deve abrigar uma franquia em breve. O segredo do sucesso é, segundo Denilson, só trabalhar com milho de qualidade — são 90 quilos por dia.
Autointitulada “a melhor pipoca do Rio”, sua fama vai longe — e chegou ao interior do Espírito Santo, onde mora Aline Donato, de 46 anos. Em visita ao Rio, com a mãe e o filho, a assistente social contou que saiu de sua cidade com a recomendação de provar a pipoca. Cada um escolheu um sabor diferente: churros, pistache e contrafilé.
— É muito boa. Só conhecia pelo Instagram. Na minha cidade só falam nela — disse.
“Começar pequeno e certo”
Entre os negócios que começaram pequenos e deram muito certo, um dos melhores exemplos é o da gigante da moda Farm. O primeiro passo foi dado em 1997, num estande de 4m² na Babilônia Feira Hype, com investimento inicial de R$ 1,2 mil. A primeira loja surgiu dois anos depois. Hoje já são mais de cem, inclusive em outros países, que faturaram mais de R$ 1,3 bi em vendas no ano passado. O Brownie do Luiz é outro caso de sucesso. Luiz Quinderé começou a história da marca vendendo o produto na escola, em 2005.
“Começar pequeno, mas começar certo” é uma espécie de mantra no empreendedorismo. Raquel Abrantes, gerente de mercado do Sebrae Rio, ensina que o primeiro passo é conhecer bem o público que quer atingir, escolher bem a localidade que vai atender e saber planejar. Outra dica é investir num negócio com o qual você se identifica:
— Não adianta montar um restaurante de sushi ou uma peixaria se você não gosta do cheiro de peixe. Tem de gostar do que está fazendo e ter capacidade de escutar e melhorar sempre.
Andrea Palmeira, dona da floricultura, acha que está no caminho certo:
— Minha loja é humanizada. Não quero vender de forma mecânica. Faço presente personalizado e com preço sempre compatível com o que o cliente pode pagar.
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