O ano de 2025 ficará marcado como um dos mais intensos na área tributária brasileira na última década. E não era para menos. Às vésperas da entrada em operação da Reforma Tributária em 2026, as empresas tiveram de correr contra o relógio para se adaptar enquanto o Congresso avançava lentamente na regulamentação das mudanças. Já o Supremo Tribunal Federa (STF), o Superior Tribunal de Justiça (STJ) e o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) também aceleraram na tomada de decisões que, na prática, redesenharam limites entre arrecadação e segurança jurídica.
O resultado foi um ambiente paradoxal: de um lado, vitórias pontuais para os contribuintes; de outro, um endurecimento crescente das exigências formais e do ônus probatório, segundo especialistas ouvidos pelo InfoMoney. Tudo enquanto o novo sistema começa a sair do papel, passando a conviver com o modelo atual.
No STF, a mensagem era clara: legalidade estrita e vedação ao confisco voltaram ao centro do jogo, ainda que frequentemente acompanhadas de modulação de efeitos. A Corte barrou iniciativas estaduais que buscavam conceder benefícios fiscais por decreto, reafirmando que compensações, remissões e anistias dependem de lei formal. Também delimitou de forma mais objetiva o alcance das multas tributárias. Ao fixar tetos para multas moratórias e estabelecer parâmetros para multas isoladas por descumprimento de obrigações acessórias, a Corte sinalizou que sanção não pode se transformar em instrumento arrecadatório disfarçado. Essa orientação, reforçada no julgamento do Tema 487, passa a valer como baliza nacional e abre espaço para a revisão de penalidades desproporcionais já aplicadas.
“O Tema 487 representa proteção significativa aos contribuintes contra multas desproporcionais e confiscatórias, oferecendo segurança jurídica ao estabelecer limites claros e previsíveis para penalidades por descumprimento de obrigações acessórias”, disse o tributarista Morvan Meirelles Costa Junior, sócio do Meirelles Costa Advogados
ITCMD
Ainda no Supremo, temas patrimoniais e sucessórios ganharam peso. A vedação da cobrança de ITCMD sobre heranças e doações do exterior, bem como sobre valores de planos como VGBL e PGBL, trouxe alívio a famílias e estruturas patrimoniais, ainda que, novamente, com efeitos modulados, segundo a advogada Anete Mair Maciel Medeiros, sócia no Gaia Silva Gaede Advogados.
“O STF entendeu que os planos têm natureza de seguro, não de herança, razão pela qual não deve haver ITCMD”, explica o advogado João Paulo Esteves Torres, do Fonseca Brasil Serrão Advogados
Ao mesmo tempo, a Corte reconheceu a omissão legislativa em relação ao Imposto sobre Grandes Fortunas, colocando pressão institucional sobre o Congresso, ainda que sem efeitos arrecadatórios imediatos.
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Previsibilidade para empresas
No STJ, o fio condutor de 2025 foi a busca por previsibilidade técnica. A Corte consolidou entendimentos relevantes para as empresas sobre prescrição e decadência, compensação tributária e responsabilidade de sócios e administradores. Ao afirmar que a compensação é um direito do contribuinte e não se confunde com cobrança, o STJ ampliou o espaço para planejamento tributário legítimo, de acordo com Anete. “Também deixou claro que a responsabilização pessoal de gestores é exceção, dependente de prova de fraude ou desvio de finalidade, protegendo a autonomia patrimonial das empresas”.
Por outro lado, algumas decisões elevaram o custo da litigância. A validação de uma única Certidão de Dívida Ativa para débitos de exercícios distintos, por exemplo, tornou a defesa técnica mais complexa nas execuções fiscais. Em paralelo, o Tribunal manteve posições arrecadatórias relevantes, como a tributação de juros de mora e a inclusão de determinados tributos em suas próprias bases de cálculo, conforme a advogada.
Laboratório para o que virá
O Carf, por sua vez, funcionou como um laboratório de como será o ambiente fiscal nos próximos anos, de acordo com os especialistas. O órgão administrativo avançou na uniformização de entendimentos com a aprovação de dezenas de súmulas, o que trouxe previsibilidade, mas também cristalizou uma postura mais rigorosa contra planejamentos considerados agressivos. Exigência de laudos contemporâneos para ágio, restrições ao uso de créditos extemporâneos e negativa recorrente de deduções retroativas de Juros sobre Capital Próprio ilustram esse movimento. Em contrapartida, houve avanços importantes no reconhecimento de créditos de PIS e COFINS ligados à manutenção de ativos, insumos essenciais e determinadas despesas operacionais, confirmando que o conceito de insumo segue sendo decidido caso a caso.
Esse mosaico de decisões revela, como observa Anete, um Judiciário e um contencioso administrativo que corrigem excessos pontuais do Fisco, mas exigem dos contribuintes um grau de conformidade e documentação cada vez mais elevado. A era das teses amplas perde espaço para uma advocacia tributária quase artesanal, altamente técnica e ancorada no detalhe factual.
Reforma Tributária
É nesse ambiente que 2026 se aproxima. O próximo ano não será apenas mais um capítulo do contencioso, mas o início da convivência prática com a Reforma Tributária. A implementação da CBS e do IBS, ainda que gradual, exigirá das empresas uma reorganização profunda de sistemas, contratos, precificação e compliance. Ao mesmo tempo, temas históricos continuam pendentes nos tribunais, como a exclusão de benefícios fiscais de ICMS da base do PIS e da COFINS, a chamada “trava dos 30%” na compensação de prejuízos fiscais em casos de extinção de empresas e os desdobramentos finais da tese do século.
Segundo Costa Junior, a mensagem é de que a Reforma não reduzirá a importância do contencioso no curto prazo, mas mudará sua natureza. “A tendência é de maior fiscalização, cruzamento de dados e intolerância a erros formais, o que torna planejamento e governança tributária tão estratégicos quanto a própria discussão judicial”.
Se 2025 foi o ano em que os tribunais redesenharam os limites do sistema, 2026 será o momento de testar, na prática, a maturidade do novo modelo. A transição promete ser longa, técnica e custosa. Mas, para quem se preparar, ela também pode representar uma rara oportunidade de reduzir litígios, ganhar eficiência e transformar a tributação em variável de estratégia, não apenas de conflito. Ou seja, 2026 será um tempo de menor criação de teses e mais sobre executar corretamente, documentar decisões e antecipar riscos, na opinião dos especialistas.
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