Em algumas casas com Ozempic, a perda de peso é contagiosa

Quando Amy Kane começou a tomar Mounjaro em 2022, ela esperava perder peso — e conseguiu, eliminando mais de 77 quilos.

O que Kane, uma criadora de conteúdo de 36 anos de Chicago, não esperava era que os efeitos na sua saúde se tornassem contagiosos. Logo após iniciar a medicação, seu marido e seus filhos começaram a se alimentar de forma mais saudável — e também se tornaram mais ativos fisicamente.

À medida que medicamentos como o Ozempic transformam a saúde de milhões de americanos, algumas famílias estão descobrindo um efeito colateral surpreendente: membros da família que não estão tomando os remédios estão mudando sua relação com a comida e, em alguns casos, também perdendo peso.

Ainda não há dados que indiquem com que frequência isso ocorre, mas especialistas médicos há muito observam efeitos semelhantes com outros tratamentos para perda de peso, segundo a Dra. Lydia Alexander, ex-presidente da Obesity Medicine Association.

Um estudo com pacientes submetidos à cirurgia bariátrica descobriu que dois terços dos parceiros perderam peso dentro de um ano após a operação do cônjuge, sendo que os parceiros com sobrepeso apresentaram as mudanças mais significativas. Outro estudo, com participantes diabéticos em um programa de emagrecimento, revelou que os cônjuges que não estavam passando por nenhum tratamento perderam, em média, quase 2,3 kg e consumiram significativamente menos calorias vindas de gordura. E, de forma anedótica, profissionais de saúde em todo o país afirmam já estar observando efeito semelhante em famílias de pacientes que tomam medicamentos como o Ozempic.

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“Esses medicamentos não apenas mudam o apetite, eles transformam a dinâmica familiar”, disse o Dr. Joey Skelton, professor de pediatria da Escola de Medicina da Wake Forest University. Em 2024, cerca de 1 em cada 8 adultos nos EUA já havia tomado Ozempic ou um medicamento semelhante — o que significa que dezenas de milhões de cônjuges, filhos e outros familiares podem estar vivenciando algum efeito dessas medicações sem nunca tê-las ingerido.

Amy Kane brinca com os filhos no quintal de sua casa em Naperville, Illinois, em 8 de junho de 2025. À medida que medicamentos como o Ozempic transformam a saúde de milhões de americanos, algumas famílias estão descobrindo um efeito colateral surpreendente: membros da família que não tomam os remédios estão mudando sua relação com a comida e, em alguns casos, também perdendo peso. (Nolis Anderson/The New York Times)

Kane, que lidava com distúrbios alimentares há décadas, contou que suas tentativas anteriores de emagrecimento faziam com que passeios em família e refeições se tornassem momentos repletos de restrições. Mas “dessa vez parece que faz parte do meu estilo de vida”, disse ela. “Não é como se eu pensasse ‘ah, não quero comer essas coisas’ ou ‘não quero ir a tal restaurante’. Eu simplesmente como menos.”

Depois de emagrecer, o tempo em família passou a ser mais ativo: Kane agora tem energia suficiente para caminhadas até o parque e festas de dança improvisadas com seus três filhos, de 10, 7 e 5 anos. E, por recomendação médica, passou a consumir mais proteínas magras e alimentos ricos em fibras — mudanças que também ajudaram seu marido a se alimentar e se sentir melhor.

“A obesidade é um assunto familiar”, disse Yelena Kibasova, gerente de eventos corporativos em Minnesota, que viu a abordagem de sua família em relação à alimentação e ao exercício mudar depois que começou a tomar Wegovy no ano passado. “Ou você faz essas mudanças e sua família acompanha, ou, com o tempo, volta aos velhos hábitos”, acrescentou.

Para algumas famílias, essas mudanças são extremamente positivas. Mas também podem trazer riscos — especialmente para crianças. Diferente da cirurgia bariátrica, que exige internação e uma recuperação mais longa, é possível que os pais façam injeções semanais de medicamentos como o Ozempic sem que os filhos percebam.

“Ver um dos pais emagrecer sem entender o motivo pode passar uma mensagem muito negativa para as crianças”, disse a Dra. Keeley J. Pratt, professora de desenvolvimento humano e ciências da família na Universidade Estadual de Ohio. As crianças podem começar a comer menos ou pular refeições, achando que estão seguindo um exemplo saudável dos pais, ela explicou.

Kibasova se preocupava com o impacto que o uso da medicação — que reduz o apetite e diminui o que muitos descrevem como “barulho mental sobre comida” — poderia ter sobre seu filho de 12 anos.

O remédio a ajudou a perder 13,6 kg em seis meses, mas ela temia que seu filho, que também enfrenta dificuldades com o peso, interpretasse sua perda de apetite e emagrecimento como uma validação de que restringir comida era o caminho certo.

Por isso, ela tentou explicar que a obesidade é uma doença, e que ela toma o Wegovy para controlar seus sintomas — assim como alguém toma remédios para questões de saúde mental ou colesterol alto.

E quando Kibasova convidou o filho para participar de sua nova rotina de treino de força — para combater a perda de massa muscular, um efeito colateral comum desses medicamentos — ela apresentou o objetivo como “construir força” e não como “perder peso”.

Seu filho logo perdeu gordura corporal, ganhou músculos e teve a autoestima melhorada, segundo Kibasova. Ela também percebeu que os treinos compartilhados a ajudaram a manter o foco em seus próprios objetivos.

Os medicamentos e as mudanças alimentares que frequentemente os acompanham também podem ter efeitos negativos sobre relacionamentos amorosos. “Se você e seu parceiro adoram cozinhar ou ir a restaurantes juntos, e de repente isso muda, é como se algo entre vocês fosse interrompido”, disse Skelton.

Estudos indicam que pessoas que fazem cirurgia bariátrica têm mais chances de se separar ou divorciar do que a população em geral. (Por outro lado, pesquisas também mostraram que pacientes solteiros que passaram pelo procedimento têm mais que o dobro de chances de iniciar novos relacionamentos em comparação com pessoas com obesidade que não fizeram a cirurgia.)

Pratt, que desenvolveu recursos para ajudar pacientes bariátricos a se prepararem e lidarem com esses desafios, agora está elaborando guias semelhantes para pacientes que tomam medicamentos como o Ozempic e suas famílias.

O ideal, segundo ela, seria que os médicos conversassem com os pacientes ao iniciar esses tratamentos e perguntassem: “Você está em um relacionamento? Tem filhos em casa? Aqui estão alguns pontos sobre os quais você deve refletir.”

Para Kia Griffin-Thomas, de 42 anos, uma das partes mais surpreendentes ao começar a tomar um remédio para emagrecimento foi ter que recalibrar como planejava e cozinhava as refeições para a família, mesmo quando mal sentia fome.

Kia Griffin-Thomas em sua casa em Griffith, Indiana, em 8 de junho de 2025. À medida que medicamentos como o Ozempic transformam a saúde de milhões de americanos, algumas famílias estão descobrindo um efeito colateral surpreendente: membros da família que não tomam os remédios estão mudando sua relação com a comida e, em alguns casos, também perdendo peso. (Nolis Anderson/The New York Times)

“Só porque eu não estou comendo, não significa que eles não estejam com fome”, disse ela.

Então, decidiu envolver seu filho de 8 anos e sua filha de 6 no preparo das refeições, algumas vezes por semana.

“Eles sentem muita alegria em cozinhar e preparar as coisas, porque dizem: ‘Olha, papai, olha o que a gente fez, olha o que a gente cozinhou’”, contou.

Essas atividades em família se estendem além da cozinha. Seu marido transformou a sala de sol da casa, no noroeste de Indiana, em uma academia, para que pudessem se exercitar juntos depois que as crianças dormem — reacendendo uma paixão que compartilhavam antes de terem filhos.

“Conseguimos dançar, sair, malhar juntos”, disse Griffin-Thomas. “Isso fortaleceu nosso relacionamento.”

c.2025 The New York Times Company

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